…algumas pessoas “prescrevem”. Alguns sentimentos, também
Um dia perguntei à Mariana Tavares de Araujo, minha filha, sua opinião sobre determinada pessoa, de quem minha filha é amiga até hoje. Ele e eu não nos falamos há mais de 20 anos. Eu gostaria de restabelecer o contato.
Resposta dela: “mãe, não tem nada a ver; essa amizade prescreveu….”.
Fiquei impressionada com a expressão porque nunca tinha ouvido o termo aplicado ao dia a dia. Fiquei impressionada com a precisão trágica do verbo prescrever aplicado aos nossos sentimentos, amores, afetos, desafetos. Aos amigos. Que sensação de esvaziamento a vida pode nos proporcionar… (Preciso ser mais cuidadosa com meus afetos….)
Talvez eu me contentasse com a simples opinião: “não, mãe, acho que não tem mais a ver. Não mãe, fulano nem pergunta mais por você…”. Seria cruel mas nem tanto.
Prescrita ou empoeirada, esquecida no fundo da gaveta do tempo… Isso soa um pouco trágico, fala de deterioração sem jeito. Me consolei com o verso do poeta e compositor espanhol Juan Manuel Serrat: “não é triste a verdade; o que ela não tem é jeito…”
Fiquei mastigando o sentimento de ter sido prescrita da vida e do coração desse amigo. Ele ainda faz parte da minha geografia afetiva. Mariana disse que isso não é recíproco. Fiquei com vontade de dizer para minha filha: será que a gente pode ser tão categórica em relação ao que se passa no coração dos outros? Foi a vida que interrompeu nossa conversa, quis justificar.
Desisti de filosofar com ela; afinal a juventude é cheia de categorias; e é bom que seja assim. Só o envelhecimento (ativo) ensina que entre o preto e o branco há muito mais do que 50 tons de cinza…
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